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segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Aγάπη, ou a autossuficiência generosa



O comportamento adequado, ideal ou propício é atingido mediante a gestão daquelas atitudes que são determinadas pelos valores supremos. Esta gestão é alcançada através do cultivo de afetos adequados. O tornar-se humano é perpretado através da aquisição da cultura. O ser humano é um jardim de afetos, emoções, sentimentos, ideias, atitudes e valores. O cultivo do jardim, por autonomia ou heteronomia, enseja a adequada motivação para agir, onde emoções e sentimentos propiciam as condições internas tidas como corretas.

Há três valores supremos: um emocional (afeição), um intelectual (curiosidade) e um prático (diligência). Temperança e humildade são os desdobramentos naturais da afeição. Afeição é o sentimento que nos mostra que o melhor mundo depende de nossa boa vontade e do nosso bom desejo, daquilo que cultivamos de melhor, de nossa generosidade, de nossa disposição em interpretar tudo da melhor maneira. Afeição é o modo pelo qual qualquer ser pode conceder (a outrem) ou exprimir (em si) a graça. A temperança se desdobra da afeição, pois interpretar tudo da melhor maneira, isto é, da maneira mais benevolente possível (sem incorrer em inexatidões), nos obriga a ter um controle sobre os afetos negativos, e nos advoga a ter predileção pelos afetos moderados, ou que não produzam moléstia em sua imoderação. Do mesmo modo, a humildade se desdobra da afeição, pois a vontade que interpreta tudo do melhor modo pode apenas oferecer ao ambiente o melhor de si, sem tomar dele nada mais do que o necessário.

No entanto, nada de verdadeiramente bom nasceria da afeição, de modo frutífero, sem ao menos a boa presença tanto da curiosidade quanto da diligência. A curiosidade (a vontade de conhecer) é que nos leva a entender as coisas tal como elas realmente são. A benevolência como estado de espírito precisa ser fundada num conhecimento adequado das coisas. A generosidade que não se funda num processo consistente de avaliação arrisca-se a ter sua nobre intenção contradita pela sua própria prática. Sem ser guiada pelo correto conhecimento de como as coisas são, o que só pode existir mediante a curiosidade, nenhuma ação ou prática poderia ser inteligentemente adequada ou propícia a um estado de coisas, seja este estado dado ou ideal. Por outro lado é a diligência (o perseverar na ação em virtude de seus efeitos) que garante que o melhor das nossas intenções tenha o efeito devido no mundo real.