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sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Explicando renda per capita e políticas de distribuição (ou sobre garotas suecas)



“Bem, amigos, este mês, com o esforço do todos, conseguimos juntar $10. Agora chegou a hora da distribuição. Como somos dez pessoas, cada um recebe $1. Eu sei que é pouco. Também olho para os vizinhos além-mar e penso que poderíamos melhorar. Lá o mesmo número de pessoas consegue juntar $50. E é por isso que cada pessoa lá ganha $5. Eu não sei como eles fazem, mas fato é que não fazemos o mesmo. Temos que descobrir o que fazer.”

Existem muitos problemas sociais, mas o segredo da riqueza, das condições materiais não está intrinsecamente em políticas distributivas, que são necessárias, mas dependem inelutavelmente da produtividade. Isso é fundamental entendermos. Fala-se de PIB porque PIB é um indicador econômico, é um indicador de riqueza. Sem dúvida o IDH é mais importante do que o PIB, só que alcançar um IDH mais alto depende de alcançarmos melhores condições materiais também. É por isso que se fala sobre PIB, porque o desenvolvimento de nosso IDH está parcialmente atrelado ao desenvolvimento de nosso PIB.

É verdade que o debate centrado nas políticas distributivas é pernicioso. Temos que debater projetos sobre a educação. É isso que está faltando. Falta-nos entender que o debate não é uma questão de ideologia, mas que se insere no campo factual e está sujeito às interpretações científicas sobre o tema, muito mais rigorosas. A economia e a educação dispõe de um conjunto de técnicas que deve ser levado a sério.

Nota: a metáfora que abre o texto corresponde a nós = Brasil, vizinhos = Suécia, e a proporção de renda é real: os suecos ganham cinco vezes mais que os brasileiros (renda por capita, nominal, dados do FMI, 2013). A população real, no entanto, difere: o Brasil é cerca de 20 vezes a população da Suécia.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

"A solução para o nosso povo eu vou dar..."1



Ricardo Amorim avisou... semana passada? Não, em 2011. Ele avisou que a vida ia piorar para quem tinha condições? Não, ele avisou que ia piorar para quem tinha menos condições. Mas, repete aí, Amorim, qual é o remédio para segurar a inflação? O que é que tem que fazer para frear o preço do tomate, da energia elétrica e tudo o mais?

Ricardo Amorim: “No caso, o remédio é a elevação da taxa de juros, que, além de frear a atividade econômica, também funciona como um mecanismo concentrador de renda. Enquanto os mais pobres, normalmente, tem dívidas, cujo financiamento fica mais caro com a alta dos juros; os mais ricos tem aplicações financeiras, cuja rentabilidade sobe junto com os juros.”

E o que deveríamos fazer?

Amorim: “Para reacelerar o processo de redistribuição de renda no Brasil, [...] o governo precisaria, apenas, de mais duas medidas. Primeiro, aumentar investimentos em educação básica. [...] Além disso, o governo deveria reduzir seus gastos. Assim, diminuiria sua necessidade de financiamento, permitindo que os juros caíssem. Permitiria também a redução de impostos, que, no Brasil, penalizam os mais pobres com uma concentração de impostos sobre consumo.”

Texto completo: http://ricamconsultoria.com.br/news/artigos/aposentando-a-maquina-concentradora-de-renda-062011

1 Título por Raul Seixas: Aluga-se

domingo, 2 de novembro de 2014

Nossa amiga, a disparidade econômica



No presente momento, o Congresso Nacional discute o aumento do seu próprio subsídio, via discussão do orçamento do Poder Judiciário. O solicitado pelo Judiciário é R$ 35,9 mil, mais de 20% acima dos atuais R$ 29,4 mil. O salário atual, R$29,4 mil, reprenta mais do que 40 vezes o que o salário mínimo. Normalmente o sálario do trabalhador médio tem sido sempre reajustado em correspondência à inflação oficial, que sequer mede a inflação real. Porque os mais altos salários públicos do país não deveriam seguir padrão semelhante? Todos aqueles que são favoráveis à diminuição da desigualdade de renda deveriam, por coerência lógica, ser favoráveis à tal proposta.

Ademais, qual é a moralidade de um grupo de pessoas que mede seu próprio desempenho? Qual é a moralidade de um grupo que decide sua própria remuneração? Devem os três poderes estarem sujeitos aos desejos do povo. Por que deveriam eles estar sujeitos à funcionamento diferente daquele aplicado ao restante da população? É de fato o que queremos, que um salário no Brasil consiga ser quase 50 vezes o valor do salário mínimo?

Por que não criamos um projeto de lei ou encabeçamos um referendo popular onde definimos que os reajustes do teto destas classes profissionais (as dos três poderes) sejam indexados a um critério objetivo, ao invés de ser discutido discricionariamente pelas próprias partes interessadas? Por que não, por exemplo, a um desempenho econômico condizente com o país? Por que não indexar os maximos subsídios à flutuação anual do PIB ou da inflação? Especialmente agora, onde o momento de um ajuste fiscal se aproxima.

É minha sugestão.

sábado, 1 de novembro de 2014

O findo debate eleitoral e o dilema político atual



Passadas as eleições, mas não sua ressaca, difícil é escolher a notícia da semana, tarefa da qual não devemos nos furtar. O uso que fizemos do período eleitoral, centrado largamente na falsa dicotomia de que o projeto de distribuição de renda era encarnado pela candidata Dilma e o de crescimento econômico o era pelo candidato Aécio falhou em nos fornecer um debate político claro e inequívoco. Isso porque deveria estar claro a todos que tanto a distribuição de renda já existente quanto o real aumento de renda de toda a população são indispensáveis. E o são por dois simples motivos: 1. Porque parte da população vive em condições deploráveis e que necessitam de uma intervenção imediata, grande e inteligente (que deve ir muito além do Bolsa-Família). 2. Porque o fracasso em aumentar a renda dos mais ricos termina por minar ou limitar o saneamento das condições supracitadas (a falha em angariar renda redunda em falta de renda a ser distribuída – é dizer: nem as condições de vida de uns nem a de outros aprimora-se).

É verdade que o aumento de renda dos mais ricos pode implicar em aumento da desigualdade social (ou mais precisamente, da disparidade econômica). E é por este motivo que torna-se necessário uma intervenção que seja, ao mesmo tempo, a mais rapidamente aplícavel, a mais ampla e aquela pela qual as pessoas com menos possibilidades consigam organizar-se em modos autossustentáveis.

Logo, tanto o primeiro projeto depende do segundo, quanto o segundo não deveria ser implementado sem o primeiro. E, evidentemente, ambos os projetos devem ser implementados pelo governo eleito, independente a qual partido pertença. Passado este ponto, o da falsa dicotomia, restaria-nos efetivamente discutir ambos os projetos, isto é, (1) qual é melhor método para fazer com aqueles que possuem menos recursos consigam organizar-se de modo autossutentável, e (2) qual é o melhor método para que a economia brasileira cresça.

Verdade é que nenhuma proposta pungente quanto ao projeto 1 (distribuição de renda) ganhou fôlego nos últimos anos, de modo que formou-se um certo consenso de que o Bolsa-Família e o Pronatec são de fato os melhores métodos dos quais se dispõe. Apresentar propostas de aprimoramento a estes programas e propostas alternativas a eles demandam maior tempo de exposição e argumentação. Por outro lado, o melhor método quanto ao projeto 2 (crescimento econômico) tem se mostrado muito claro em boa parte da mídia, há pelo menos dois anos, senão mais. Creio que devemos compilar as perspectivas críticas que surgiram nestes últimos anos, tanto para que o debate político prossiga, quanto para esclarecer ideias equivocadas, preconceituosas e completamente falsas que o debate eleitoral mal-intencionado (ou mal-informado) ensejou. Ideias estas que não devem se perpetuar para todos nós que sempre sonhamos com um Brasil cada vez melhor.

Bom, mas e a tal notícia da semana? Fico com esta, do economista Mansueto Facundo de Almeida Jr: http://mansueto.wordpress.com/2014/10/28/a-dificuldade-do-ajuste-fiscal/ - aliás, valeria a pena ler seu blog de cabo a rabo.