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quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Um lembrete, em tempos de prostituição e trivialidades

Convém àquele que quer (para mim querer é ato intransitivo, que, no máximo, poderia ser traduzido por querer tudo - mas concedo aos mais despreparados o seu objeto particular, sua fantasia), escolher bem as encruzilhadas onde venderá seu corpo - ou sua alma. Como se sabe, a sorte e o destino se dão em função dos caminhos e das escolhas. Precioso que a vontade saiba seduzir, do modo que lhe convier: que cante, que inebrie, que dance, que apazigue... O modo pelo qual a vontade conquistará os seus amantes não precisará condizer com mais de duas coisas: o seu destino e ela própria.
Jorge Papapá canta inescrupulosamente o amor veraz, o amor de ninguém: o amor é de ninguém e é narcísico, só quer a si mesmo (não quer, portanto, o ódio). Somos o meio, nós, os tradutores. Traduzimos o amor em amor, mas creio que ele estava falando do desejo. É como Delari [deleuze+guattari] pretendendo nos dizer para perder o nome e o rosto e sermos impessoais. Mas quem ama pode ser tão pouco minucioso? E, para nós, contemporâneos, se o amor se livra das amarras é para cair nos fluxos fugazes do desejo. Mais uma vez, escolhi o caminho do meio - e nada poderia ser tão infrutífero. O ciúme nos torna radicais, e também a solidão. Mas não toda a solidão. Não para quem é generoso com a solidão. Mas eu não estou mais sozinho, escondi minha solidão nos outros. Finjo estar perto para poder levar mais longe. Descobri que mais do que dicordar, gosto de levar mais longe. Porque reconheço que você me atravessa de um jeito que então não posso ser inteiro. Procuro-te em pensamento e não acho algo que diga algo, miragens móveis, voláteis no deserto. O corpo arfava enquanto a mente prescrutava, e não posso ser eu simplesmente quando você está no meio. E você é precisamente aquilo que está no meu meio, aquilo que está estorvando o meu fim. Se você é a seta que me desmonta querendo outra coisa, é oportuno eu te erguer e jogar longe. Sei bem fazer isso: sem que te doa. Você é um pouco a seta e um pouco o alvo, mas depois o que quero está além de você. Atravessada na garganta, que engole seco ou sangue. E o silêncio é mais incompetente 'que eu.
De Leve [http://dicamelim.blogspot.com] foi pro funk (ou melhor: estilo foda-se?) e fez sua obra-prima, na minha singela e superficial opinião: O que que nego quer? [http://media.trama.com.br/tramavirtual/mp3/m_38/193152.mp3 http://www.youtube.com/watch?v=EK7Apnie-4E] E a pergunta que coloco é: até onde pode esse movimento levar? Qual a mais pura nata do "vulgar" da sexualização (se existe a sexualização é porque um dia nós, seres sexuais, nos dessexualizamos)? Quer dizer: alguns estão tentando criticar a bunda com a própria bunda - e quem, de sã consciência, vai hoje no brasil se opor às bundas? Somos feitos delas! O punk brasileiro hoje não é o funk? Lembro-lhes, amigos, que quem faz cultura é a arte. Ou a maldição do pop (acessibilização da obra ao gosto) é a moda que veio pra ficar? Questões prementes para nós, artistas contemporâneos (estou falando da arte no mundo hodierno, e não da arte pós-Duchamp, que era um ignorante genial, e que influenciou muitos 'artistas', digamos, para ser afirmativo, que errar uma vez é procurar, e errar outras vezes é continuar procurando - como se conseguiu em plena modernidade não ter uma visão histórica? ou não se entender que o conceito está na própria metáfora e é mais belo que assim esteja? ou que o relativismo, o subjetivismo só implica em qualquer coisa num sujeito destituído de vontade estética, mais conhecido como o nihilista? - eles mal sabem o que é arte, fizeram dela um paradoxo quase ininteligível), que lutamos pelo espaço para demonstrar nossa arte sempre através das mais eficazes (e, portanto, mais deturpadas) traduções. A sedução é tanta que não sabemos mais o que é sério e o que não é (João Brasil [http://fmjoaobrasil.blogspot.com] diz que faz suas músicas de maneira séria, e que só agrada os outros porque agrada a si mesmo - fico eu pensando: e eu, gosto desse papapapapaparára porque tem suíngue ou por que me faz rir?). O que é o aprimoramento do narcisismo (deixaram os blogues de ser, se é que um dia foram, de adolescentes meigos e carentes ou, simplesmente, os rapazes ganharam barba e as moças cortaram o cabelo propondo a sua produção cultural - música, literatura, intelectualidades, dando estilos coquetes - e às vezes subversivos - ao seu inocente desejo de ser amado?)? Se há já no eu a instância do outro (como Freud perspicazmente propunha), o que me agrada em mim mesmo não é talvez o outro que há em mim? Se a fantasia é inerente ao humano, nossa questão fundamental é a dialética do desejo? Sofreremos sempre de nos entregarmos demais ao outro ou não nos entregarmos de modo algum? Sadismo e masoquismo no templo da democracia.
O trivial gera polêmica e o mau gosto nos redime. Nem mais eu sei se estou usando o caminho mais fácil pra chegar no lugar mais difícil (será que esse caminho leva lá?) ou se estou propondo o outro caminho (será que então é possível que ele realmente leve a algum lugar?).
O que sei é que nunca suplicaria como Miguel Torga (incrível que pareça, a solidão é mais impossível que o amor).

Um comentário:

Anônimo disse...

hehehe... é difícil, quiçá impossível, hoje em dia,dizer qualquer coisa que não encontre alí adiante uma posição CONTRÁRIA! Será isso um problema? O que condiciona uma tal situação? A a riqueza de pontos de vista? A pouca densidade dos pontos de vista? Ou, porque não, as duas coisas juntas, riqueza e... leveza, força nas pernas e ligeireza nos pés?!!
Não sei se você vai chegar em algum lugar novo, ou se é o caminho que trilhas que é diferente; o que sei é que repetes o que nosso tempo, mesmo as portas de sucumbir ao pop, não cessa de fazer: errar, vagar, ceder à forças centrifugas, deixar-se ir por uma linha do fora, aprendendo que, aí mesmo onde parece que a força se dissipa, ela apenas afirma um outro lado forte de si mesma: a morte como convite ao recomeço...